terça-feira, 30 de julho de 2013

O astronauta



Se eu fosse um astronauta, iria de planeta em planeta te buscar. Deve ter algum mapa do satélite onde se escondeu, ou do coração novo em que foi morar. Veja minha casa, está repleta da ninhada de gatos e passarinhos mortos que deixou. Das garrafas esparramadas no chão e cinzas de cigarro na janela. Será que em algum momento bêbado te mandei ir embora? Meu lençol está desarrumado e nem sequer dormi em minha cama. Amanheci sozinho no tapete da sala e sem nenhuma risada por perto. Sua risada me acalmava, mesmo quando era servida de um xingamento. Volta, me xinga. Me solta um tapa na cara e diz que não tá nesse mundo pra servir mais um idiota. Aliás, não tá pra servir ninguém.

Mostra que sua nave tá pronta pra embarcar em outra. Diz que viveu anos luz longe daqui e viveria mais cinquenta vidas sem ter me conhecido.  Não precisa me conhecer, só fica por perto. Nunca me conheceu muito bem mesmo, até quando te mandava ir embora, você ia. Era pra ficar. Sempre foi pra ficar. Só que agora não vejo mais seu sutiã largado em meu sofá e o relógio na pia da cozinha. Sinto sua falta, e binóculo nenhum consegue enxergar além das nuvens, e você tá muito além disso.

Vem, discute comigo. Me manda calar a boca e parar de dizer coisas que não vão chegar em lugar nenhum, só te fazer afastar mais. Diz que tem uma corda segurando minhas costas e em qualquer momento você vai puxa-la e me fazer dizer as mesmas frases automáticas de sempre: Sinto sua falta, você é linda e me desculpa.

Para de ativar esse disco voador que só te faz rodar e cair em um quintal qualquer. Onde só vai encontrar mais um ponto de partida. Para de partir. Para de querer ir embora de tudo que não conhece. Ir embora de mim.

Me diz que não preciso ser um astronauta pra conseguir ir atrás de você e imaginar que talvez, precise sair do meu mundo, pra quem sabe, te alcançar.

Me diz qualquer coisa, só não deixa o silêncio achar que essa é a última despedida.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

E agora?



Vamos lá. São só alguns passos do elevador até o supermercado. Nunca foi tão difícil fazer compras em uma cidade grande. Antes mesmo de abrir o portão para sair do prédio me deparo com pessoas cuspindo nas ruas, carros buzinando e cachorros lambendo o lixo. Coisas que antes não precisava enxergar, pois o caminho era mais  fácil quando tinha alguém para amenizar a sujeira do mundo.

Preciso de algo para pensar enquanto sigo o nosso caminho no chão. Vou programando a lista de compras como  se não tivesse anotado no papel amassado no bolso. Por um instante me arrependo de não ter ido pela outra rua, o caminho seria mais longo, mas pelo menos não teria de me distrair.

Lembro que o cigarro está no bolso e paro aliviado procurando o isqueiro. Qualquer solidão é menor com um cigarro nas mãos. Acendo e olho pro céu como um agradecimento por não ter que ir tão sozinho pela avenida. O cigarro mata, mas também alivia. Passo pelo pit dog que sempre toca música aos sábados. Hoje é sábado. Sinto que a música faz parte de uma trilha sonora onde minha vida é a protagonista. A música era alegre demais, apresso meus passos para não lembrar que este mesmo percurso também já foi mais feliz.

Percebo uma menina atravessando a praça. Seus olhos sorriem e por um instante penso em pedir alguma informação mentirosa e treinar meu jeito de ser sociável novamente com mulheres. Começo a andar mais devagar, no mesmo instante em que o telefone da menina toca e um sorriso em seus lábios se abre. O jeito é apressar os passos. Talvez ela tenha namorado. - pensei -  Ninguém nesse mundo é sozinho.

O supermercado está na outra esquina. Suspiro aliviado que tenha sobrevivido a minha primeira ida ao supermercado sem desabar em lágrimas. Entro e já não sei mais o que fazer. Quando íamos sempre procurávamos primeiro as bebidas, e depois a janta do final de semana inteiro. Percebo um atendente carregando laranjas em um carrinho e quase penso em pedir ajuda.

"- O que eu faço, cara?"

Talvez um supermercado não seja um bom lugar para um homem solteiro.

Retiro a lista do bolso e pego um carrinho qualquer jogado pelos cantos. Passo pela geleia de vinte e três reais que ela adorava comer com torradas pela manhã.

- Geleia italiana é a única coisa que me faz sorrir quando acordo.

É o que ela dizia. Para mim tinha mais gosto de morangos mofados misturado com gelatina. Coloco a geleia no carrinho e saio em busca das torradas. Nunca sabemos quando alguém vai voltar. O carrinho está cheio e só falta comprar algo para beber. Outro suspiro fundo.

Vinho. Ela adorava vinho tinto suave. Seco, jamais. Passávamos horas discutindo qual o melhor vinho e sempre levávamos o mesmo. Será que nossa rotina que a fez enjoar? Peguei o mesmo vinho de sempre e um pouco de comida japonesa do quiosque. Hora de ir embora. Alguma hora a gente tem que ir embora.

Paguei a conta com meu cartão de crédito, recolhi as sacolas e me senti mal por não ter ido de carro.

E agora, como irei acender outro cigarro?





terça-feira, 9 de julho de 2013

Tudo que convém

Um dia vou dominar o mundo.

Sou um rapaz controlador, diria minha psicologa. Sou uma pessoa que sabe o que quer, diria minha mãe. Na verdade sou apenas alguém precisando de um bom motivo para não estar mais aqui. Tenho um sorriso preferido que gosto de ver todas as manhãs, mas não sei quais são os dias em que vou vê-lo. Gosto de ficar sozinho todas os domingos à tarde, mas não sei qual domingo vou precisar de companhia. O mundo é tão incerto e enquanto não o manuseio conforme gostaria, vou seguindo seu ritmo. Pacato, lento, frustrante. 

Já me apaixonei e descobri que paixão não é tão bom quanto chocolate derretido no céu da boca, mas já troquei muitos dias de filmes e chocolates para estar ali, apaixonado. Conforme vamos crescendo percebemos que a vida é isso mesmo, não existe mágica, contos de fadas e duendes carregando potes de ouro pelo jardim. A vida é isso mesmo, trocamos o que mais gostamos, pelo o que mais queremos... E a gente nunca sabe realmente o que quer.

Aos oito anos meu maior medo era não gostar de desenhos para sempre, aos vinte percebi que medo é bobagem, e sempre trocava de canal na hora do jornal. Com quinze pensei que algumas pessoas eram pra sempre e não me preocupei com a mudança das coisas, e aos trinta já não lembrava mais quais eram meus sonhos.

Hoje vejo desenhos sozinho e assisto jornal só para saber por onde devo andar.


Tudo o que não vou te dizer




Tá bom, vai. Não foi tão legal assim. A gente nem dava tanto certo pra achar que era algo especial. Tudo bem, sentia sua falta todos as quartas e queria te ver todas as sextas, mas sempre precisava esperar algum momento mágico que te fizesse enxergar que eu tava aqui, sempre aqui.

Não me olha com essa cara. Aliás, para de olhar para baixo e presta atenção em mim um pouco. Vê se pela primeira vez me enxerga direito e não pensa que sou apenas um rapaz que se contradiz à todo momento. Não me manda sumir como se fosse adiantar. Sempre achei que sumir fosse uma boa solução, mas pra mim nunca adiantou, pra você já? 

Não fica com dó de me magoar. Continua balançando a chave do carro entre os dedos como quem pede para sair. Sai logo, vai embora. Joga na minha cara que vivo em um mundo imaginário, que escrevo coisas que não existem, e dá um sorriso de canto como quem diz "Já passei por muita coisa na vida, e não preciso suportar isso."

Vai, me deixa aqui nesse meu mundo imaginário onde sei que você vai voltar e dizer que só tava com sono, e por isso perdeu a paciência. Me dá um sermão dizendo que preciso parar de ser de todo mundo, e diz que por mais que odiasse, você sente falta do meu abraço.

Anda de mãos dadas com outro na rua, mas não me deixa te ver só do outro lado. Vai, não fica com dó. Me deixa andar do lado de vocês e segurar sua mochila enquanto te vejo abraçar ele apertado. Diz que tá com fome e me pede pra te levar comida na sua casa enquanto você assiste seu filme preferido com ele. Diz que acordou sem vontade de viver, e me chama pra ir te ver, te levo sua comida preferida e um sorriso pelas metades.

Não me deixa aqui jogado, com os lábios tremendo querendo segurar o choro. Sei que sou um rapaz todo errado, mas não me deixa te observar indo embora. Para de me ignorar, diz que sou um idiota e que você encontrou um amor pra sua vida, mas que não quer me ver indo embora dela.

Some de mim não, vou sumindo aos poucos junto. Me dá a mão e diz que isso é um pesadelo, me segura e vai pro meu mundo imaginário comigo.

Só não me deixa pensar que tudo não passou de imaginação e que a gente, na realidade,  nem dava tão certo assim. 

sexta-feira, 26 de abril de 2013

De todos os idiotas do mundo



Se alguém estivesse me observando em cima de um prédio, teria visto a imagem perfeita e patética de um homem vagando pela rua e batendo de frente à um poste. De cima as coisas são mais superficiais, são o que são. Apenas um homem batendo o rosto com toda a força em um poste de concreto.

Já as pessoas que estavam do outro lado da rua, sentadas na lanchonete da esquina, mascando chiclete e observando aquela avenida pouco movimentada às oito da manhã, elas conseguiram ver um homem de estatura mediana, que estava andando de cabeça baixa até ergue-la e se deparar com o par de olhos sorridentes mais entristecidos que atravessava aquela imensidão de carros. Pessoas como eu não levantam a cabeça para prestar atenção no caminho, e por isso dão de frente com o poste. 

Foi assim que me tornei o cara mais idiota do mundo. 

-

A gente sempre foi parte um do outro, mesmo não querendo ser.

Acho que comecei a tentar entende-la depois que perguntei o que era mais forte para ela: Sentir saudade ou sentir falta. A resposta veio como quem não sente nenhum dos dois:
 - "Saudade."
Passei minha vida inteira procurando alguém que conseguisse entrar em uma discussão comigo e saísse sem perder. Entendo que sentir falta é mais forte, mais bonito. Sentir falta é quando já não há com o que preencher o vazio, saudade é quando tem para o que voltar. Me pareceu que ela nunca sentiu vazio algum para conseguir explicar uma pergunta tão simples.

Demorei a entender que seu jeito desligado era sua melhor parte. Quando estávamos com amigos e conhecidos, sempre foi radiante, os mesmos olhos sorridentes que me fizeram bater de frente ao poste. Quando ficava só nós dois, seu jeito era de quem não tinha muitos motivos para sorrir, apesar de perceber que ela estava onde queria estar.

Com o tempo percebi que havia ficado tempo demais ao seu redor, e mesmo assim, não queria sair de perto. Somos iguais, mas tentamos nos iludir sendo opostos. Enquanto subo a escada, ela pega o elevador descendo - mas o importante é querer se achar.

Ela não me queria. Essa era a única verdade. Continuava perseguindo essa vontade dentro de mim como se fizesse algum sentido. Não podia desistir, e por isso continuei batendo de frente com vários postes até conseguir um lugar fixo que me fizesse não ter medo.

Passei a não ter medo. Passei também a querer ir embora por qualquer motivo, qualquer razão. Nunca teve sequer uma razão que me fizesse dizer que não valia a pena. Estar com ela valia tanto a pena que esquecia de como era a vida fora do nosso mundinho. Nosso mundo tão apertado e cheio de discussões pela manhã.

Quando chegou o dia dela partir, ir embora passar o tempo, que antes gostaria que fosse meu. Quando chegou esse dia, percebi que as pessoas são o que são, não o que a gente imagina delas. Nessa de imaginar que por ventura, por obra de algum destino ou força de vontade, tudo iria se ajeitar e ficaria, em fim, no lugar, perdi o final da história que nem sequer havia começado.


Sou o cara mais idiota do mundo, pois só o cara mais idiota do mundo consegue achar alguém tão igual para se viver e mesmo assim, não conseguir ter vivido nada por medo.


domingo, 21 de abril de 2013

Máquina de pensar



Teve um tempo em que vivia de poesia. Hoje não sei mais poetizar.
Não existe tristeza maior para um poeta do que não saber o que escrever.

É só vazio da mente. Coração sempre esteve vazio, ora essa.
Não saber para onde viajar pelas linhas enrijecidas do cérebro. Não há mulher que preencha esse jovem velho que anda por aí sem consultar o relógio. Não há sentimento de mulher que me faça querer tirar o pijama, passar um perfume e tirar minha bicicleta da garagem.

Tenho um emprego meia boca que da pra sustentar meu vício de chocolate aos fins de semana. Minha bicicleta é lavada todo mês e troquei as rodas dela semana passada, agora são de aço. Não preciso de muita coisa, só de um pouco de poesia.

O tempo anda ruim para quem vive de pensar. Não há muito o que se pensar e as pessoas estão começando a me passar um tédio desconfortável. Meu mau humor está tomando conta até mesmo da minha cozinha. Veja só, o tanto de louça para lavar. Talvez eu também precise de um banho, mas não vou me levantar desse sofá, é sábado.

Meu telefone toca pelo menos cinco vezes a cada hora, ainda bem que existe o modo silencioso. Podia existir isso fora de aparelhos eletrônicos, como, por exemplo,  nas pessoas. Elas falam muito e eu gosto apenas de ler. Deve ser por isso que escrevo, não preciso ouvir minha voz nessas letras miúdas de computador.

Gostaria de ter uma máquina de escrever, mas teria que parar de comer chocolate aos finais de semana e economizar para ir até um antiquário. Onde já se viu, uma coisa tão antiga, e tão cara. Pensei em quebrar meu cofrinho mas descobri que não tenho jeito para quebrar as coisas. Provavelmente vou tentar colar novamente, não sei deixar nada aos pedaços, é difícil ficar olhando para aquilo depois.

Deve ser por isso que nunca me olho no espelho.


quinta-feira, 11 de abril de 2013

O dia que ganhei um coração



Antes de você chegar, faço as contas de quantos suspiros já dei da cozinha até o quarto. Vou ao banheiro, me olho no espelho, abro a geladeira de duas portas e mais parece que estou abrindo um buraco negro e tentando sair de todo esse frio que meu corpo produz do estômago até o começo da espinha. Tento não deixar a casa organizada demais, afinal, sua chegada nem é tão importante assim para limpar tudo. Sujo dois pratos comendo o resto da comida chinesa e um pedaço da minha fracassada torta de limão da noite passada. Pronto, o telefone já pode tocar.


Oito horas e dois minutos. Pontualidade britânica se não fossem os dois minutos em que ficou dentro do táxi esperando a máquina do cartão finalmente passar. Desço e espero com um sorriso de lado, sorrisos assim te irritam, mas é melhor do que mostrar os dentes. Abro todas as portas da minha casa e falo para esperar no sofá enquanto vou mexer em alguma coisa na cozinha. Nunca mexo em nada. 

Volto e lá está, olhando para o mesmo quadro que sempre encara quando te faço esperar. Tento fazer alguma piada, perguntar alguma coisa, mas sempre é como se tudo estivesse bem. Nunca sei se realmente está, mas olho pra baixo e finjo estar com fome, só assim concordamos em algo e nos olhamos dentro dos olhos. 

Conseguimos ficar em silêncio a maior parte do tempo sem nos sentir desconfortáveis, mas sempre estamos. Reparo que o seu cabelo está preso com uma presilha diferente e sua unha com o esmalte descascando. Não tem muito assunto, sempre a mesma coisa, sempre a mesma certeza de que não precisa dizer muito pra se sentir bem.

Meu telefone toca.

A voz do outro lado diz que acordou querendo me ver, mas digo que estou com uma amiga assistindo filmes e semana que vem a gente marca alguma coisa. Desligo o telefone e já não lembro quem era. Volto a encarar a presilha presa em seu cabelo bagunçado e acho aquilo a coisa mais linda do mundo, mas não digo. 

Ela diz que pareço um homem de lata, fingindo ser de aço mas no fundo só quer ter atenção e um coração. Eu digo que ela é um leão covarde que pretende ser o dono da selva, mas na hora não tem força pra aguentar a pressão. Brigamos a noite inteira por causa de uma comparação boba com o filme "O mágico de Oz", e quando parece que finalmente um vai ignorar para sempre a outro, aparece um sorriso aberto e um empurrão que deveria ser um abraço. 

Sempre dormirmos na metade dos nossos planos. Nunca assistimos todos os filmes, ou comemos todas as comidas que pedimos. A gente tenta não dormir, mas sempre cochila nos intervalos. É a hora que se levanta e vai embora. Chama o táxi, despede e agradece sabe-se lá pelo quê. 

Ela entra no táxi e meu sorriso de canto vira um sorriso entre dentes, mas ninguém vê. 

Finalmente o homem de lata ganhou um coração.

E é uma ironia ela não saber... que é todo dela. 

domingo, 10 de fevereiro de 2013

O barato de ser somente só



Existe dias na vida de um cara em que ele toma a consciência de que é só mais um cara.

Só mais um cara andando nas ruas em uma segunda-feira, só mais um cara bebendo cerveja após o expediente, só mais um cara sendo

Ninguém gosta do Frank Sinatra cantando alto pelas paredes do meu quarto, ninguém gosta dos meus filmes em preto e branco onde a mocinha nunca fica com o mocinho, ninguém entende minha vontade de comprar um livro apenas por gostar da capa.

Tenho dias de cão, e outros de gato. Dias em que preciso pular no colo de alguém e implorar atenção, lamber o rosto da pessoa e uivar quando sinto sua falta. Outros, fico deitado nas cobertas com cara de tédio e comendo porções enlatadas enquanto me escondo do mundo. Tem dia que sou mais gato do que cão.

Sou fácil de ir embora, mas sou mais fácil de voltar. Diga que tem uma cama confortável, um pouco de carinho nas horas vagas e, quem sabe, um coração descongelando na geladeira. Eu fico. Diga que tem um cigarro dentro da gaveta, e eu fico. Ninguém precisa inventar desculpas ou sentimentos para me ter, um dia de amor vale por dois de desespero.

Não preciso de muito amor. Pouco amor me basta. Desde que seja amor.

Uma vez me falaram que só sei amar o impossível, só sei querer o que não posso ter. Nunca tive muita coisa, talvez por isso sempre desejei ter muito. Um cara simples, que tenta se vestir bem e comer coisas saudáveis para não ficar velho e gordo, é só isso o que faço.

Não estou nem perto de ser realmente sozinho, tenho amigos em uma roda, conhecidos em uma avenida, e corações entregues em minha porta todos os dias. A solidão vem de dentro. Minha solidão vem de não ter onde me esconder quando só quero fugir dessa cidade cheia de sonhos vazios e lugares lotados de gente fedendo a cigarro e cerveja derramada na camisa de duzentos reais.

O bom de fingir que é só, é não dever nada a ninguém... Inclusive a si mesmo. 

domingo, 13 de janeiro de 2013

É platônico até deixar de ser

Nunca tive caminho, rumo, direção.

Sempre me perdi nos ossos que deixava no canto do quarto depois de mastigar a carne. Era sempre assim, nunca do meu jeito, mas sempre do meu gosto.

Apertei milhões de quadris em minhas pernas, sufoquei milhões de gozos em minha boca, fiz de corações puro capitalismo. Chamei um táxi, e lá vai meu último encontro do dia. Sempre assim, sempre intacto.

Fiz do meu coração um lar para desabrigados e da minha mente um mar de sonhos afogados. 

Criei muitas expectativas, fiz de sonhos, solidão. 

Fiz de sorrisos, mágoas, e de minha mente, escravidão..

Jurei que amores são assim, platonicamente existenciais, platonicamente criados.

Tenho amores de primavera, amores de verão, até amores que são eternos, mas nunca amores que se eternizarão. 

Quem sabe dia ou outro paro com essa mania de criar.

Criar amores é minha maior diversão.

De todos meus romances, sei, nenhum sobrará.

Por isso crio alguns platônicos, pro coração ficar mais cheio, e a solidão menos vazia.



Vai que um dia dá certo, e eu paro de tentar. 

sábado, 5 de janeiro de 2013

Quem desdenha quer amar



Lembro que gostava de puxar seu cabelo durante as aulas. Estudávamos juntos na mesma sala e apesar de sentir quando estava ao seu lado, uma vontade incontrolável de sorrir, fazia justamente o contrário.

Quando percebia que iria ficar com cara de bobo, lá estava eu, implicando, mordendo e falando que ela era a menina mais feia que já habitou esse planeta. Todos meus amigos riam. Ela só virava as costas e ia embora. Minha vontade era de ir junto.

Isso foi na quarta série. Ainda não sabia como distinguir qual o perfume que mais gostava, doce ou afrodisíaco, mal sabia como beijava uma menina. Tempos difíceis essa quarta série.

Uma vez a professora deixou nós dois de castigo. Juntos, no canto de uma sala vazia que tinha no corredor. O motivo era claro: Precisávamos parar de brigar durante as aulas. Senti meu estômago embrulhar, contorcer e uma vontade de sair gritando pelo pátio. Quando entramos na sala permaneceu um silêncio profundo, digno de um funeral. Sabia que de mim não iria sair nada, com ela era tudo ao contrário. Como pode? Um menino de nove anos sentir tanto medo e por medo, maltratar uma pessoa.

Não lembro direito desse dia, só que chegamos a um acordo de que não nos suportávamos, mas teríamos que nos comportar na aula. Então parei de puxar seu cabelo nas aulas. Gostava de puxar seus cabelos pois com o vento da janela, o cheiro de seu shampoo ia direto para meus pulmões.

Continuei empurrando-a pelos corredores, derrubando seus livros e escondendo sua mochila. Meus amigos me perguntavam porque só fazia isso com ela. As outras estavam com espinhas, colocavam bolas de papel para parecer que tinham seios e mastigavam chiclete de boca aberta. A verdade é que nunca me importei com as outras. Ela, ela tinha o vestido rasgado perto da costela, e aquilo era a coisa mais linda que já vi. Tinha que implicar com o rasgadinho, senão iam achar que estava olhando demais. Quem olha demais, alguma coisa tem.

E tinha.

Tinha ela, tinha todo meu sentimento de pré adolescente que nunca queria crescer, só pra poder continuar implicando e discutindo com a menina mais feia que habitou a terra.

No final do ensino médio a beijei, e perguntei se queria morar um tempo no meu mundo, lá ela não era tão feia assim como eu dizia.

O que ela fez?

Me deu um tapa nas costas, me empurrou e puxou de volta.

(...)

Ah, que saudades da quarta série!

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Grandes cidades de corações pequenos



Tem gente que acha que gostar é fácil. Por isso gosta muito, gosta várias vezes ao dia, gosta por gostar. Gostar é permitido, não tem amor, quem sabe paixão, mas amor não. Posso gostar de você e ir embora sem esclarecer o motivo. Tem gente que não sabe gostar.

Não sei fazer muita coisa, quem sabe um pouco de imaginação aqui, ironia ali, mas gostar eu sei. Gosto porque no mundo não existe muita poesia, e até mesmo eu que gosto tanto de ler palavras ao vento, não acho bom soltar elas por aí. 

Tem dia que gostar parece um desses momentos de raiva que passamos no trânsito: Só serve pra deixar a gente com vontade de beber. Então vou lá e bebo. Bebo até meu celular piscar e dizer "Manda uma mensagem, eu tô aqui pra isso". Tem gente que ouve até o coração, por que não um celular? 

Um dia pensei que essa história de gostar junto é melhor do que gostar sozinho. Gostar junto é aproveitar os pontos bons e ruins de todas as pessoas, e todo esse blablabla que lemos diariamente na internet e programas de auditório. Francamente? O que seria de todo meu sofrimento se existisse um sorriso ao lado?

Gostar direito, é gostar mesmo longe.

Por isso que quase ninguém entende as entrelinhas do amor.