sábado, 5 de janeiro de 2013

Quem desdenha quer amar



Lembro que gostava de puxar seu cabelo durante as aulas. Estudávamos juntos na mesma sala e apesar de sentir quando estava ao seu lado, uma vontade incontrolável de sorrir, fazia justamente o contrário.

Quando percebia que iria ficar com cara de bobo, lá estava eu, implicando, mordendo e falando que ela era a menina mais feia que já habitou esse planeta. Todos meus amigos riam. Ela só virava as costas e ia embora. Minha vontade era de ir junto.

Isso foi na quarta série. Ainda não sabia como distinguir qual o perfume que mais gostava, doce ou afrodisíaco, mal sabia como beijava uma menina. Tempos difíceis essa quarta série.

Uma vez a professora deixou nós dois de castigo. Juntos, no canto de uma sala vazia que tinha no corredor. O motivo era claro: Precisávamos parar de brigar durante as aulas. Senti meu estômago embrulhar, contorcer e uma vontade de sair gritando pelo pátio. Quando entramos na sala permaneceu um silêncio profundo, digno de um funeral. Sabia que de mim não iria sair nada, com ela era tudo ao contrário. Como pode? Um menino de nove anos sentir tanto medo e por medo, maltratar uma pessoa.

Não lembro direito desse dia, só que chegamos a um acordo de que não nos suportávamos, mas teríamos que nos comportar na aula. Então parei de puxar seu cabelo nas aulas. Gostava de puxar seus cabelos pois com o vento da janela, o cheiro de seu shampoo ia direto para meus pulmões.

Continuei empurrando-a pelos corredores, derrubando seus livros e escondendo sua mochila. Meus amigos me perguntavam porque só fazia isso com ela. As outras estavam com espinhas, colocavam bolas de papel para parecer que tinham seios e mastigavam chiclete de boca aberta. A verdade é que nunca me importei com as outras. Ela, ela tinha o vestido rasgado perto da costela, e aquilo era a coisa mais linda que já vi. Tinha que implicar com o rasgadinho, senão iam achar que estava olhando demais. Quem olha demais, alguma coisa tem.

E tinha.

Tinha ela, tinha todo meu sentimento de pré adolescente que nunca queria crescer, só pra poder continuar implicando e discutindo com a menina mais feia que habitou a terra.

No final do ensino médio a beijei, e perguntei se queria morar um tempo no meu mundo, lá ela não era tão feia assim como eu dizia.

O que ela fez?

Me deu um tapa nas costas, me empurrou e puxou de volta.

(...)

Ah, que saudades da quarta série!

Um comentário:

  1. Gostei muito do texto. Bem direto. Faz reviver todo um passado que julgara escondido e esquecido. As mesmíssimas emoções de outrora foram-me sentidas. Foi como se tivesse revivendo tais situações demais gostosas pela inocência. Parabéns pelo texto!

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