segunda-feira, 9 de abril de 2012

Amor é coisa de criança


Hoje quando voltava do trabalho parei para descansar um pouco no parque. Era uma hora bonita do dia, o céu misturava em cores e já não conseguia distinguir o vermelho do laranja. Sentei no primeiro banco que encontrei e ao meu lado estavam dois meninos que aparentavam um desconforto entre si. Descontentes em sua companhia.

Ignorei a tristeza existente ao redor e voltei para admirar as cores que mudavam agora para um tom ainda mais confuso. Quando o sol se pôs por completo senti meu pulmão sugar todo o ar e soltá-lo com um alívio distante de mim.

A semana havia sido difícil, e finalmente surgiu tempo para organizar meus pensamentos e ideias. Evitava falar de sentimentos e sobre o que me constituiu ao decorrer da vida. Não é fácil amar nos tempos de hoje, e sabia disso. Sinto que perdi muito tempo olhando fixamente para uma estrela que antes me pareceu um avião. Sei que sem notar, um dos meninos se sentou ao meu lado e me olhou fixamente. Antes que pudesse pronunciar qualquer surpresa, o menino de cabelos pretos e enrolados voltou o rosto, olhou para a mesma estrela e disse:

- É verdade que não existe o amor? - suspirou - Meu amigo disse que é conto de fadas e não senti mais vontade de conversar com ele. Foi embora bravo e fiquei aqui sozinho. Percebi que olhava para o céu e pensei que também estivesse triste, e quando não é por amor que as pessoas ficam triste é por dinheiro. Você está triste por dinheiro?

Soltei um riso diante da inocência de uma criança em sair de seu banco e ir conversar com uma estranha. O menino não parecia ser pobre, pelo contrário, usava bom tênis, camisa de marca e óculos de grau que devem me custar um mês de trabalho. Vendo que hesitei em responder, me olhou novamente e sorriu.

- Você não tem cara que sofre por dinheiro. Mas sabe, minha mãe diz que dinheiro não compra felicidade, e meu pai diz que dinheiro só não compra amor. Fui contar isso para o Pedro, meu amigo que estava aqui, e ele me falou que seus pais diziam se amar, mas hoje o pai dele mora com uma moça em outra cidade e que amor é pra pessoas idiotas. Você também acha isso?

Soltei um sorriso entre dentes e falei:

- Se amor fosse para idiotas, grandes referências como Chico Buarque, Cazuza e Elis Regina não falariam sobre ele. Creio que amor é para quem acredita, não?

- Não sei quem são esses, mas você tem cara que sabe das coisas. Aliás, todo adulto tem. Queria ser grande logo, para mostrar que sei das coisas. - mexeu em uma folha seca jogada no banco e continuou - Todo dia dou meu lanche para uma menina da minha escola, e fico sem comer. Não faria isso por mais nenhuma outra, isso é amor? 

- Se gosta de ter ela por perto, e fica feliz quando a vê feliz com seu lanche, é uma das qualidades do amor. Não precisa ser padronizado, entende? Tem casal que se ama muito, mas se separam às vezes por motivos que o amor não pode interferir, pode ser o caso dos pais do seu amigo.

- É. Você fala difícil, mas eu consigo entender. Meu pai é advogado e vive dizendo que amor não existe nos contratos de divórcio, não da para dividir em separação de bens e calcular perdas e danos por isso. "O amor é um estrago que já vem sem reembolso." Quando solta essa frase, não entendo bem, só que sempre o observo rindo de lado e bobo para minha mãe, então entendo que não é possível colocar sorrisos bobos no papel e pedir dinheiro em troca.

- Algumas pessoas mantém o privilégio de fazer o amor durar pela vida inteira. É para poucos.

- Só não entendo o porquê de você ser tão calada. Meus pais dizem que converso muito, e converso mais nos dias em que a menina da minha sala, a que dou o lanche, pede algum material emprestado. Fico sorrindo para ela do modo que meu pai sorri para minha mãe, e torço para me devolver o material após a aula, assim podemos ir até o pátio para conversar. Ela é linda, sabia? Não conseguia diferenciar bonito do feio, então vi que ela tinha uma mecha do cabelo torta e achei aquilo engraçado, mas um engraçado de querer ter sempre aquilo por perto para mim. Soa estranho? 

Comecei a rir diante do menino que não parava de contar histórias. Falava, perguntava, e no fundo, meu desejo era soltar de uma vez que amor era algo que não existia mais, extinto como os dinossauros. 
Só que tudo fazia muito sentido, ficava olhando ele dizer como se fosse uma pequena miniatura de mim. Passamos horas conversando enquanto seus pais faziam compras no shopping. Apresentei meus poetas preferidos e músicas mais tocadas. Não quis contar que por amor há dias em que a gente sofre, perde o coração e não consegue de volta. Esses detalhes o tempo nos faz descobrir sozinhos. Também não quis contar que a menina da escola era só uma paixão, afinal, nunca se sabe.


Sei que voltei para casa com um brilho diferente naquela noite, como se a estrela que olhei por tanto tempo tivesse voltado comigo.

Não cheguei a dizer para ele... Mas sabe de uma coisa?

Ainda bem que o amor existe.

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